Mercado de carros no Brasil
Uma discussão dos números recentes do mercado.
A pandemia trouxe um nível de incerteza econômico elevadíssimo. Os agentes econômicos realizaram seus movimentos de proteção, vendendo ativos de risco e demandando moeda precaucional. O excesso de poupança, aliado à queda na velocidade de circulação da moeda, tornou possível o aumento significativo da liquidez internacional, sem gerar pressões persistentes sobre a inflação. O Gráfico 1 descreve um comportamento nunca visto em toda a história recente do capitalismo: um nível de taxa de poupança das famílias acima de 15% de sua renda pessoal disponível. Um aumento realmente sem precedentes da poupança precaucional, aliado aos generosos programas de transferências governamentais, e um mercado de crédito desaquecido. Em março de 2020, quando a economia mundial parou, a taxa de poupança registrou uma marca de 33,7%, fazendo com que a velocidade de circulação da moeda (M2) caísse de 1,38 no primeiro trimestre para 1,10 no período seguinte, e assim permanecesse.
Muitos brasileiros são apaixonados por carros. O sonho do carro novo faz parte do imaginário de inúmeras pessoas, mesmo havendo uma crescente onda pela adesão de meios alternativos de transporte. O carro era e ainda é um item de consumo bastante estimado e que reflete desejos, status, prazeres e mais uma série de apreços emocionais.
Porém, desde o início da pandemia, os carros têm se tornado mais caros e mais raros de serem encontrados. O mercado de usados voltou a se reaquecer e, para alguns carros novos, há fila de espera. Boa parte desse problema pode ser explicada pela crise de oferta de produtos e insumos que o país vem enfrentando desde o último trimestre de 2020. Os preços dos insumos, ligados à cadeia produtiva dos veículos, disparou; praticamente todos os componentes foram afetados.
Segundo os dados extraídos da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), houve o licenciamento de 142,7 mil carros em maio/21, a produção de 141,7 mil e a exportação de 36,9 mil automóveis. Esses números são, respectivamente, 28%, 38% e 12% inferiores se comparados a maio/19. Entretanto, superiores a maio/20, o segundo pior mês da história recente da indústria de veículos de passeio nacional.
Analisando os últimos dez anos da indústria de veículos de passeio, observa-se um primeiro momento de queda, que vai de junho/12 a dezembro/15, um período de estabilidade em 2016, seguido de uma lenta retomada a partir de janeiro/17 até dezembro/19. Em 2020 observamos a formação de um “vale”.
A curva de licenciamentos de carros foi superior à produção até fevereiro/15, devido à importação de veículos e câmbio favorável. Após esse período a tendência se inverte, e a produção (linha azul) ultrapassa os licenciamentos (linha laranja), movimento que segue assim desde então, salvo raras exceções. Em outras palavras, as exportações de veículos superaram as importações desde fevereiro/16.
Desde dezembro/20 a produção de carros de passeio no país aponta para baixo (linha azul), com uma fraca recuperação da exportação, e o número de licenciamentos andando de lado. O fato é que produção e licenciamentos andam juntos, mas chamamos atenção para a curva de produção com viés de baixa. A falta de veículos pode estar relacionada ao saldo de veículos importados e exportados, que vem caindo ano após ano (estamos exportando mais e importando menos), o que estaria sendo suportado pelos estoques das montadoras já em baixa.
Se analisarmos o período acumulado entre janeiro e maio de cada ano, observamos que, em 2021, foram produzidos 756 mil carros. Desconsiderando 2020, esse é o pior ano desde 2017 (que já não era bom) quando a produção foi de 897 mil carros. Já os licenciamentos (linha laranja) foram quase os mesmos em 2021 e 2017, com 680 mil carros. Acontece que, em 2017, exportamos, entre janeiro e maio, mais de 300 mil carros (linha roxa), contra apenas 166 mil em 2021.
Em 2021 observa-se uma recuperação da indústria de veículos de passeio se comparado a 2020, se é que é possível comparar com 2020! Porém, sobretudo em relação à produção, estamos ainda 140 mil carros abaixo de 2017, o que representa uma queda de 15%.
Sem dúvida, os efeitos da pandemia são sentidos na quebra da cadeia de fornecimento de insumos e peças para a indústria, no repasse de preços via commodities e variação cambial, ajustando tais impactos através de preços dos veículos.